Raramente se discutem na Justiça do Trabalho questões ligadas à violação de direitos autorais, já que, em geral, elas são analisadas sob o ponto de vista do direito civil ou penal. Mas, quando a violação de direitos autorais surge no contexto de uma relação de trabalho ou de emprego, a JT tem competência para apreciar e julgar a matéria.
Na 10ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, o juiz Marcelo Furtado Vidal julgou um desses raros casos, em que um cantor religioso pediu o reconhecimento de vínculo de emprego com uma igreja evangélica. Além disso, o cantor relatou que recebeu a quantia de 10 mil reais pela gravação de 30 mil cópias de CD's de sua autoria, cujo sucesso ensejou diversas outras tiragens. Mas, de acordo com o reclamante, a igreja, a gravadora e as empresas de reprodução e distribuição de produtos fonográficos religiosos, também reclamadas no processo, se recusaram a lhe pagar os valores devidos sobre a venda de CD's dessas tiragens extras.
Analisando os fatos e as provas, o julgador identificou a presença dos elementos caracterizadores da relação de emprego. E descobriu ainda que foi imposto ao cantor religioso a assinatura de um contrato de cessão e transferência de direitos autorais. Por isso, ele decidiu declarar o vínculo empregatício entre as partes, condenando a igreja evangélica ao pagamento das parcelas típicas da relação de emprego. Foram deferidas também as indenizações por danos materiais e morais decorrentes da violação dos direitos autorais do cantor, a serem pagas pelas reclamadas, de forma solidária. Relação de emprego X serviços voluntários decorrentes da devoção religiosa Ao pedir o reconhecimento do vínculo empregatício entre as partes, o reclamante alegou que se apresentava como cantor em shows musicais nas igrejas da ré por todo o Brasil, em cronograma definido pela empregadora, sendo indispensável a autorização patronal para as apresentações. De acordo com os relatos do cantor, eram pagas a ele todas as despesas e custos com hotéis, viagens, vestuário e instrumentos musicais, já que os réus se beneficiavam da mão de obra ao receberem quase toda a parte dos dividendos das doações dos fiéis. Segundo o cantor, a remuneração consistia em pagamento antecipado de R$ 10.000,00 pela autorização de gravação inicial de 30 mil cópias de CD's, recebendo também doações das igrejas, em média, de R$ 2.500,00 por mês. Ele disse ainda que havia uma espécie de punição conhecida como "disciplina", pela qual quem descumprisse regras impostas pela instituição religiosa ficaria impedido de realizar outros shows no período. A ação foi ajuizada em face da igreja evangélica, da gravadora que produziu o CD do cantor, do missionário fundador da igreja, que também era o proprietário da gravadora, e das empresas que replicaram o CD. O pedido de reconhecimento de vínculo empregatício foi formulado em relação aos três primeiros réus. Negando a existência de relação de emprego, eles alegaram que a atividade desenvolvida pelo cantor era de cunho estritamente religioso, caso típico de prestação de serviços voluntários por fiel da Igreja, como forma de demonstração da própria fé e do amor ao próximo. Enfatizaram os réus que a oportunidade para participar nos cultos como cantor só veio em um segundo momento, alguns meses após a formalização do contrato de cessão de direitos autorais, e que a atividade era voluntária, sem qualquer expectativa de retribuição financeira. Reiteraram que o cantor, na qualidade de membro da instituição religiosa, contribuiu para o trabalho pastoral da Igreja, evangelizando através da música e dedicando-se ao cumprimento do objetivo principal da Igreja, que era anunciar a Palavra de Deus. Salientaram os réus que, embora possa ter havido algum tipo de pagamento, em valores ou em utilidades, isso não era salário, mas simples retribuição para subsistência, o que afastaria a onerosidade necessária à configuração do vínculo de emprego. Disseram ainda que também a subordinação não foi comprovada, tendo em vista que a prova testemunhal demonstrou que não havia fiscalização ou controle das atividades do cantor e porque o procedimento chamado "disciplina" não era forma de punição. Entretanto, ao analisar o conjunto de provas, o juiz sentenciante verificou que as testemunhas ouvidas a rogo dos réus poucas vezes tiveram contato com o autor, algumas delas em apenas uma única ocasião. Por essa razão, não poderiam elucidar, de forma detalhada, como se dava a prestação dos serviços do autor aos réus. Por outro lado, as testemunhas indicadas pelo reclamante conviveram com ele diretamente dentro da igreja evangélica, presenciando as condições vivenciadas por ele. Dentre essas testemunhas, o julgador destacou o depoimento do repórter da igreja, que relatou ter anunciado várias vezes os locais em que o reclamante iria cantar. Disse que ele cantava em cultos quase a semana inteira, em várias cidades e que, muitas vezes, recebia do pastor. Informou ainda que havia horário determinado para comparecer aos cultos e que isso acontecia às 07h, às 14h e às 17h. Em caso de falta, o cantor levava advertência. O repórter confirmou que o reclamante não podia mandar outro cantor em seu lugar. Quanto à punição, disse que, quando o membro da igreja está sob "disciplina", ele fica impedido de fazer qualquer trabalho, sendo variável a duração dessa restrição. Nessa circunstância, a pessoa "disciplinada" não pode mais participar de qualquer atividade da igreja. Nesse contexto, o magistrado acolheu como verdadeiras as informações prestadas pelas testemunhas ouvidas a pedido do autor, entendendo evidenciados todos os elementos caracterizadores do vínculo de emprego. Para o juiz sentenciante, ficou claro que o autor, como cantor religioso, não prestava serviços somente de cunho espiritual em benefício da comunidade religiosa, mas, sim, em proveito da pessoa jurídica da Igreja, para a qual empregava seus dons artísticos para a evangelização dos fiéis, mas com caráter oneroso, já que essa auferia lucros, em cifras consideráveis, com a venda dos CD's por ele gravados. "Importante ressaltar que restou devidamente comprovado que o reclamante prestou serviços de forma pessoal (não podia fazer substituir-se por outrem), subordinada (havia determinação das igrejas de que deveria comparecer nos cultos e, inclusive, punições na forma de disciplinamento com a determinação de afastamento do labor, em espécie de aplicação de penalidade de suspensão), não eventual (cantava por vários dias durante a semana), e mediante o recebimento de remuneração (houve o pagamento não somente pelos CD's gravados, mas também pelas apresentações em cultos e shows)", completou. Conforme acentuou o julgador, é possível existir um contrato de trabalho entre o cantor religioso e sua Igreja, porque esta última constitui pessoa jurídica de direito privado, pela regra do inciso IV artigo 44 do Código Civil e, nessa condição, pode celebrar contratos de trabalho ou ser considerada empregadora. O magistrado reiterou que o cantor religioso pode, independentemente de sua devoção religiosa, estabelecer com a Igreja um contrato de trabalho para a prestação de serviços, os quais, mesmo compatíveis com os deveres de fé e devoção, com eles não podem ser confundidos. Portanto, de acordo com as ponderações do julgador, o interesse espiritual do reclamante não afasta, por si só, o vínculo de emprego, pois a fé e o trabalho não se excluem. Ao contrário, é razoável crer que um empregado encontre sua realização pessoal e profissional simultaneamente.
"De tudo, o que se pode concluir é que a submissão do autor às determinações da Igreja não decorria pura e simplesmente de sua fé, mas sim em razão da subordinação jurídica existente no liame contratual. A ideia, por certo, é a de que, ao assumir a função de cantor, assumiu, por consectário, o compromisso de propagar e respeitar a doutrina da igreja, o que, todavia, não implica a não existência de subordinação, pois, além de propagar a fé, deveria cumprir e observar todas as ordens emanadas da Igreja", finalizou o juiz sentenciante, reconhecendo o vínculo empregatício entre as partes.
Direitos autorais no contrato de trabalho O principal argumento dos réus foi o de que o cantor cedeu de forma livre e espontânea os direitos decorrentes das composições de sua autoria e que sobre o contrato firmado entre as partes não recai nenhum tipo de vício de consentimento. Alegaram que a cessão de direito constitui ato jurídico perfeito, nos termos do artigo 49 da Lei 9.610/98, e que não há prova de que o autor foi obrigado a ceder seus direitos autorais. Assim, argumentaram, não tendo havido coação na cessão dos direitos autorais, não se pode falar em existência de prejuízos materiais e morais. Inicialmente, o juiz salientou que a Justiça do Trabalho é competente para apreciar e julgar a matéria, tendo em vista que a pretensão de receber indenizações por danos materiais e morais decorre ao menos de relação de trabalho, já que o contrato de cessão e transferência de direitos autorais foi formalizado antes da admissão do autor como empregado, o que se enquadra na expressa previsão contida no artigo 114, inciso I, da Constituição Federal. O magistrado iniciou a sua fundamentação com os seguintes questionamentos:"Seria justo que alguém lucrasse pelo trabalho, a inspiração e a arte de outro sem que o autor da obra participasse dos lucros? Certamente que não. Cada emissora de rádio, show ou outro tipo de empreendimento com fins lucrativos deve prestar a devida parcela do seu lucro a quem ajudou a produzir essa arte. Por outro lado, a Igreja é um empreendimento com fins lucrativos? Não, segundo a definição do próprio Estado brasileiro". Continuando a sua reflexão sobre a matéria, o julgador observou que, no caso, não se trata de simples participação do cantor em cultos religiosos que não gerariam lucros. Na audiência, a ré confessou, através de seu preposto, que os CD's gravados pelo autor eram vendidos na sua livraria, no valor unitário de R$ 15,00 a primeira tiragem, com 30 mil CD's, e mais duas tiragens de 3 mil cada. Ao examinar a prova documental, o magistrado considerou que os documentos juntados ao processo, que demonstram a cessão e transferência de direitos autorais às rés para duplicação, replicação e tiragem de CDs gravados pelo autor, são nulos de pleno direito porque constituem verdadeira renúncia aos direitos materiais sobre a obra que criou. Entretanto, ele ressaltou que a ilegalidade do ato não consiste simplesmente na assinatura de um contrato de cessão e transferência de direitos autorais, até porque tal possibilidade é prevista na legislação que regula a matéria (Lei 9.610/1998, em seu artigo 49), mas, sim, na comprovação de que os cantores da Igreja reclamada o são obrigados a fazê-lo. Foi isso que o julgador descobriu ao analisar o depoimento de uma testemunha. Segundo as declarações dessa testemunha, que também atuou como cantor na igreja, era necessário assinar um termo de renúncia de direitos autorais, pois essa era a condição imposta pela igreja para continuar cantando. "Ora, o direito patrimonial garante aos autores usufruírem da utilização de suas obras, notadamente em casos como o presente em que eivados de ilegalidade os atos para sua suposta cessão e transferência", concluiu o juiz sentenciante ao julgar procedente o pedido de indenização a título de danos materiais, em face das vendas de CD`s gravados pelo cantor. Com base na aplicação de vários critérios de cálculo, referentes a quantias, números, lucro e despesas, os valores foram fixados em 200 mil reais, para a indenização por danos materiais, e em 15 mil reais, para a indenização por danos morais decorrentes da violação dos direitos autorais do cantor. O juiz havia deferido, ainda, uma indenização por danos morais, no valor de 10 mil reais, decorrente da exposição do reclamante em meios de comunicação da igreja. Mas, a 8ª Turma do TRT-MG decidiu excluir esse valor da condenação, por entender que não houve prova consistente desse fato. Por maioria de votos, a Turma julgadora decidiu também aumentar o valor da indenização por danos materiais, de 200 mil para 360 mil reais. Foi mantida a condenação solidária da gravadora, uma vez que ficou caracterizada a formação de grupo econômico. Notícias jurídicas anteriores sobre o tema: 05/06/2012 06:02h - Cruz Vermelha Brasileira é condenada a pagar direitos autorais a um instrutor de primeiros socorros 02/02/2012 06:03h - TRT-MG reconhece direitos autorais de empregado que compôs música em homenagem à Infraero 03/05/2011 06:03h - Empresa que utilizava nametones criados por empregado sem divulgar a autoria deverá pagar indenização 12/01/2010 06:00h - Professora deve ser indenizada por trabalho intelectual comercializado pela escola 22/08/2008 06:38h - Colégio que vendia apostilas preparadas por professor é condenado a pagar direitos autorais 28/09/2007 06:40h - Empresa que utilizou produção intelectual de empregado é condenada a pagar indenização por direitos autorais 19/01/2015 06:02h - JT não reconhece vínculo de emprego entre Igreja e voluntária religiosa 22/11/2012 06:07h - Turma reconhece vínculo de emprego entre pastor e igreja 04/02/2012 06:09h - PM tem reconhecido vínculo com igreja evangélica na qual trabalhava como segurança 31/05/2010 06:09h - Igreja não pode usar fé e espiritualidade para mascarar relação de emprego 18/03/2009 06:05h - JT reconhece relação de emprego entre policial militar e instituição religiosa 10/12/2008 06:02h - Serviço voluntário deve ser comprovado pelo termo de adesão celebrado entre as partes 29/01/2007 06:02h - Atividade religiosa não gera vínculo empregatício | |
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PÓS-GRADUADO EM DIREITO ADMINISTRATIVO
PÓS-GRADUADO EM DIREITO CIVIL E PROCESSO CIVIL
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PÓS-GRADUADO EM GERENCIMENTO DE MICRO E PEQUENA EMPRESA
GRADUADO EM HISTÓRIA
PROFESSOR DE CURSO PREPARATÓRIO PARA CONCURSO PÚBLICO
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segunda-feira, 14 de setembro de 2015
Cantor de igreja evangélica consegue reconhecimento de vínculo empregatício e indenização por violação de direitos autorais em CDs produzidos e vendidos pela instituição religiosa
Turma reconhece natureza salarial de comissões pagas sob o disfarce de participação nos lucros (14/09/2015)
Turma reconhece natureza salarial de comissões pagas sob o disfarce de participação nos lucros (14/09/2015) Se o trabalhador recebe valores decorrentes da sua produtividade mensal, sob a forma disfarçada de PLR (participação nos lucros ou resultados), de forma habitual e como remuneração pelo trabalho, essa parcela deve ser reconhecida como comissão, integrando o salário para todos os fins. A decisão é da Sexta Turma do TRT-MG, que, adotando o voto do desembargador relator, Anemar Pereira Amaral, negou provimento ao recurso dos reclamados e manteve a sentença que reconheceu que os valores pagos ao trabalhador sob a denominação de PLR eram, na verdade, comissões, parcela de cunho salarial e que, por isso, integram a remuneração para todos os fins. Em sua análise, o relator observou que o reclamante recebia comissões, mas que eram denominadas como PLR. Ao examinar o "Acordo de Participação nos Lucros ou Resultados" do banco empregador, ele notou que a parcela era apurada com base em quantitativos mensais, levando em conta a quantidade e margem dos negócios gerados (semestralmente), com aplicação de tabelas especificas para cada cargo e, ainda, considerando o percentual de inadimplência da carteira gerada e mantida pelo empregado. Ou seja, a parcela era calculada com base na produtividade individual do empregado, com avaliação inclusive mensal, mas com pagamento semestral com intuito, na impressão do julgador, "de mascarar a natureza salarial da verba". Dessa forma, conforme ressaltou o desembargador, o salário do reclamante era misto, composto por salário fixo, acrescido de parcela intitulada PLR, mas, de fato, tinha natureza de comissão. "Não há dúvidas, portanto, que, sob a forma disfarçada de PLR, o autor recebia, com habitualidade, valores decorrentes da sua produtividade mensal, por meio de fictícia participação nos lucros ou resultados. Nesse quadro, deve ser reconhecido que a parcela paga ao autor, de forma habitual e para fins de contraprestação, corresponde, na verdade, a comissões e integra o salário para todos os fins", finalizou o relator. ( 0000368-85.2014.5.03.0106 ED ) Secretaria de Comunicação Social Seção de Imprensa e Divulgação Interna imprensa@trt3.jus.br |
NJ ESPECIAL: TRT-MG firma Tese Jurídica Prevalecente nº 1 - Multa do art. 475-J do CPC não se aplica à execução trabalhista (14/09/2015)
O processo de execução visa alcançar a satisfação do crédito reconhecido na sentença condenatória transitada em julgado. Ele é impulsionado por atos praticados pelas próprias partes na ação, assim como pelo juiz e seus auxiliares para, em uma linguagem simples, "dar a cada um o que é seu". No processo do trabalho, a execução possui regras próprias, dispostas no Capítulo V da CLT. Entretanto, naquilo em que a CLT for omissa, aplicam-se as regras do CPC (Código de Processo Civil), desde que não contrariem ou não sejam incompatíveis com as normas específicas da execução trabalhista. É a aplicação subsidiária do direito processual comum ao direito processual do trabalho (artigo 769 da CLT).
De acordo com o CPC, quando o crédito a ser executado já está certo e determinado, ou seja, quando a execução for definitiva e a sentença já estiver liquidada, será aplicada uma multa ao devedor que não pagar a dívida no prazo legal. Esta multa está prevista no artigo 475-J do CPC, pelo qual, "caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento".
Aí surge uma questão: A multa do artigo 475-J do CPC é aplicável ao processo do trabalho? Ou seja, ela é compatível com as normas próprias que regem a execução trabalhista e que estão previstas na CLT? A matéria sempre foi objeto de polêmica no judiciário trabalhista, com divergência de entendimentos entre os juízes e Turmas do TRT mineiro. Alguns julgadores entendem que sim, que a multa se harmoniza com as normas da execução trabalhista, estando de acordo com os princípios fundamentais do Direito do Trabalho, já que visa tornar mais rápida a satisfação do crédito, o que é muito importante quando se trata de crédito trabalhista, devido ao seu caráter alimentar, essencial para a sobrevivência do trabalhador. Esse entendimento, inclusive, já estava sedimentado na súmula 30 editada pelo próprio TRT/MG.
Mas, ainda assim, entendimentos diferentes persistiam entre os magistrados trabalhistas. Isso porque, para alguns juízes e desembargadores, a multa do artigo 475-J é incompatível com o dispõe o artigo 880 da CLT, regra que faculta ao executado na ação trabalhista pagar ou garantir a execução, sob pena de penhora. Assim, para os seguidores dessa linha, a multa prevista no diploma processual civil não tem aplicação no processo de execução trabalhista por contrariar normas previstas na própria CLT.
Atento às divergências sobre a matéria, o Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Walmir Oliveira da Costa, atuando como relator do Processo na TST-RR-10367-73.2014.5.03.0167, suscitou, de ofício, "Incidente de Uniformização de Jurisprudência" (lUJ) no âmbito do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais, com base artigo 896, parágrafo 3º da CLT e no artigo 2º, inciso I, da Resolução na 195/2015. O tema foi o seguinte: "MULTA DO ARTIGO 475-J, DO CPC. APLICABILIDADE AO PROCESSO TRABALHISTA".
Vale lembrar que a uniformização de jurisprudência é um incidente processual que visa a manter a unidade de jurisprudência interna de um Tribunal, evitando a desarmonia nos julgamentos proferidos pelas diversas turmas que o compõem. Dessa forma, o Tribunal é provocado a se pronunciar acerca de um tema jurídico objeto de controvérsia, antes de prosseguir no julgamento de um caso concreto.
Foi assim que o Pleno do TRT de Minas, em Sessão Ordinária realizada em 14 de maio de 2015, conheceu do Incidente de Uniformização de Jurisprudência suscitado, e, no mérito, por maioria simples de votos, firmou-se a Tese Jurídica Prevalecente de nº 1, com o seguinte verbete:
"MULTA DO ART. 475-J DO CPC. EXECUÇÃO TRABALHISTA. Em face do disposto nos arts. 769 e 880 da CLT, a multa prevista no art. 475-J do CPC não se aplica à execução trabalhista".
O relator, desembargador Anemar Pereira Amaral, apresentou proposta de voto no sentido de se manter a Súmula 30 do Tribunal que, como visto, expressa o entendimento de que "A multa prevista no artigo 475-J do CPC é aplicável ao processo do trabalho, existindo compatibilidade entre o referido dispositivo legal e a CLT".
Mas o desembargador José Murilo de Morais, 1° Vice-Presidente do TRT mineiro e designado como redator do acórdão, discordou do posicionamento do relator e, assim, foi o primeiro a se manifestar sobre a tese vencedora, acolhida pela maioria dos julgadores.
Inicialmente, ele frisou que o artigo 475-J do CPC determina o acréscimo da multa de 10% ao valor da condenação se o devedor não efetuar o pagamento do crédito certo e liquidado no prazo de quinze dias, quando, então, a requerimento do credor, seria expedido mandado de penhora. Entretanto, conforme explicou o redator, o artigo 880 da CLT, mesmo com a redação que lhe foi conferida pela Lei 11.457/07, faculta ao executado pagar ou garantir a execução, sob pena de penhora. E, na visão do desembargador, a análise dos dois dispositivos torna evidente que a regra do CPC não pode ser aplicada à execução trabalhista.
Isso porque o artigo 769 da CLT só admite a aplicação das normas do direito processual comum nos casos em que o texto celetista for omisso e desde que sejam compatíveis com as normas do processo judiciário do trabalho. E, no caso, nos termos do voto vencedor, a norma que se quer aplicar subsidiariamente é compatível com os princípios do direito processual trabalhista, mas a lacuna, que é outro requisito, não existe, em razão das regras próprias contidas no artigo 880 e também nos artigos 882 e 883, todos da CLT. E é esse o entendimento que vem se consolidando na jurisprudência do TST.
O desembargador redator ponderou ainda que, de acordo com o artigo 889 da CLT, aos trâmites e incidentes do "processo da execução" são aplicáveis, naquilo que não contrariarem ao título que trata do "Processo Judiciário do Trabalho", as normas que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública Federal, regulado pela lei 6.830/80. E o artigo 8º desta lei diz que o executado será citado para, no prazo de cinco dias, pagar a dívida com os juros e multa de mora e encargos indicados na certidão de dívida ativa, ou garantir a execução, podendo, para tanto, efetuar o depósito em dinheiro, oferecer fiança bancária, nomear bens à penhora ou, ainda, indicar à penhora bens oferecidos por terceiros e aceitos pela Fazenda Pública (art. 9º). Ou seja, aqui também há o enfrentamento da questão da falta do pagamento da dívida liquidada por parte do executado, de uma forma diferente daquela disposta no artigo 475-J do CPC.
Com esses fundamentos, adotados pela maioria dos desembargadores, firmou-se a tese jurídica prevalente de que a multa do artigo 475-J do CPC é inaplicável ao processo do trabalho.
Proc.: 10367-2014-167-03-00-5-IUJ - Acórdão em 14/05/2015
Confira outras notícias jurídicas sobre a matéria:
19/03/2013 06:03h - Base de cálculo da multa do artigo 475-J do CPC é valor bruto da execução
20/04/2012 06:06h - 1ª Turma confirma que multa do 475-J do CPC é compatível com processo trabalhista
05/04/2011 06:06h - Turma aplica multa do artigo 475-J do CPC
18/11/2010 06:09h - JT decide que multa do 475-J é compatível com o processo do trabalho
10/05/2010 06:01h - 9ª Turma aplica Súmula 30 do TRT-MG e decide que multa do 475-J é compatível com o processo trabalhista
06/11/2008 06:10h - Prazo previsto no artigo 475-J do CPC é compatível com prazos da CLT
07/04/2008 06:04h - 1ª Turma decide: multa do artigo 475-J do CPC é aplicável ao processo do trabalho
22/01/2007 10:01h - 4ª Turma determina aplicação da multa do art. 475-J do CPC em execução trabalhista
Confira os entendimentos divergentes anteriores das Turmas do TRT/MG sobre o tema:
Pela aplicação da multa do artigo 475-J do CPC ao processo do trabalho
Pela incompatibilidade da regra processual civil à execução trabalhista
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